sábado, 2 de maio de 2009

A Força da Palavra

Uma palavra devolve-me o tempo exacto. Nela me instalo. E sou feliz ou infeliz. Mas à minha maneira.
Posso tapar os olhos para não a ver, os ouvidos para não ouvi-la; cerrar a boca para não pronunciá-la. Não adianta. A palavra irrompe. A palavra irromperá quer queiramos ou não. Porque a palavra é um símbolo. Com ela se desenham a liberdade e as algemas; com ela se estabelece a guerra e inaugura a paz.
A palavra é suavidade, loucura, são folhas e folhas esboçando um tempo a vir.
É uma janela aberta, uma lágrima incontida.
Partem velozes as palavras, quando se libertam. Crescem como sons e repercutem-se quando encontram o campo desejado.
A palavra é uma alta cidade que nasce às cegas, sobressaltada ou intolerante. Ou intolerável.
Peça de um maravilhoso ofício, pode ser um grito doloroso, uma estrela desintegrada, um punhal acerado.
A palavra fere, humilha, repõe, exalta, congrega, unifica, destroi. Nela respiramos e dela se alimentam os seres mais tristes ou mais perturbados.
Ela é oficinal trabalho do poeta, o infinito para que convergem os seus dias. Quando o impedem de procurá-la, matam-no em silêncio. Quase sem reparar. Mas matam-no, porque na palavra se confunde ou se alimenta o operário dos símbolos. Mal se lhe toca e logo a palavra o envolve e com ela faz um corpo místico de luz e destino.
A palavra é o drama. A luz. A angustia em tinta apressada.
Por ela se desce aos infernos, com ela se exalta e se humilha.
É preciso olhar bem a força da palavra, Vê-la por dentro. Descobrir-lhe a luz e ainda e sempre a outra face que esconde.
Todavia, apesar de toda esta luz em que quase não reparamos, uma palavra não vem.
Procura-se e não vem.
Espera-se há muito e não há quem a escreva. Ou quem a leia. Ou quem a diga.
Procura-se uma palavra.
Uma palavra que destrua a solidão; que inaugure os gestos simples, os sorrisos claros, que espalhe entre os homens a esperança e a paz.
Procura-se uma palavra.
É pequenina
É branca.
É um sorriso voltado para o ódio.
Uma pomba voltada para o amor.
Procura-se uma palavra. Tão breve que se confunde com um beijo que se dá sem saber porquê. Ou uma lágrima. Ou uma flor.

(de Maria Rosa Colaço)

2 comentários:

Fernanda disse...

Que texto tão bonito...
O final,...então,...é lindo...
Gosto das tuas escolhas...:)

Beijo

Su disse...

fer...merci. jocas sempre